excursão ao alentejo


Diga lá, Ti Maria
o que mais lhe agradou

Gostei muito de ver
os campos ceifados
fez-me reviver
os tempos passados
quando a gente ceifava
de sol a sol
todos os dias
a comer sopas frias
as costas num oito
o que nos valia
era o baile à noite
e os beijos roubados
outras idades
tempo que passou
apesar da penúria 
sentimos saudades.

E você, Ti Alfredo?

Estava farto de ouvir
segredar aos ouvidos
que tinham comido
vacas, porcos, carneiros
nas terras roubadas
aos donos legítimos
por Deus doadas
como diz o prior
conversa dos casqueiros
da confederação
estava com medo
de que fosse verdade
e fiquei com vontade
de lá ir
ver com os meus olhos
que eram mentiras 
só mentiras.

E você, Ti Henriqueta

Eu sou alentejana
vim do Alentejo
já crescidinha
lembro-me bem
de fugir à frente
da guarda
só por ir apanhar
um tanganho
uma boleta
a esse tempo
eles querem voltar
só não gostei
porque à légua os cheiro
daquele da cooperativa
onde dormimos
com ares de manajeiro
queria estar enganada
mas assim
vai acabar mal.

E tu, Jaiminho?

Eu, cá pra mim
só não gostei 
daquele grupinho
sempre à parte
sempre juntinho
dizia um 
com ar
de professor
isto não tem jeito
andar, andar
dois dias a andar
devíamos parar
num sítio
pra ligar às massas
sujar as mãos
na terra.

Eles não entendem, Jaiminho
nem nunca entenderão
que a força desta excursão
é mesmo esta gente 
ver
com os seus olhinhos
as mentiras
dos casqueiros 
da confederação
verem as sementeiras
verem o gado
e acima de tudo
verem que é 
por todo o lado.

E você, Ti Carrasqueiro?

Eu cá do que mais gostei
foi da cara dos casqueiros
quando lhes semeámos 
os cartões 
da confederação
que eles
nos tinham passado
rasgadinhos
em pedacinhos
como se fossem papéis 
de carnaval
em cima dos cornos
quando vinham 
lá do plenário
de defender 
o latifundiário
de Braga ou de Rio Maior 
sei lá 
alguns nem saíram
nem se atreveram
na estação
mas a gente não
lhes fizemos mal
foi só medo
medo é favor
tiveram pavor
fascistas!
aldrabões!



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